Sempre me instiga o momento presencing* em processos de desenvolvimento. Refiro-me ao instante em que tudo ao redor pausa. Até mesmo nosso pensamento paira no ar. Um silêncio profundo nos envolve preenchendo o ambiente, aquietando mentes e aumentando as pulsações.
Frequentemente, não percebemos esses movimentos enquanto acontecem. Somente os notamos quando pausamos e observamos em retrocesso os eventos que nos provocaram a tomar decisões importantes, a aceitar convites improváveis, a realizar escolhas que alteraram o curso do nosso futuro previsto.
Quem já não se sentiu encurralado, sem saída, paralisado com a questão presente? Quem nunca sofreu com nó na garganta em uma conversa que desafia seus paradigmas? E com o enfrentamento da divergência em situações que nos colocam à prova e nos levam ao limite? Na maioria dos casos, estas sensações antecedem o ponto de virada ou presencing.
A calmaria só toma seu espaço adiante, no segundo em que conseguimos atravessar a fronteira limiar do futuro que quer emergir por meio de nós e em nós. É depois de acessar este lugar figurado como uma centelha de suspensão do tempo e do espaço, então, que somos capazes de fazer o que precisa ser feito. Isto é, conseguimos abrir mão e deixar ir o que é superficial, extrínseco, desnecessário. Deixando permanecer, assim, somente o que é essencial e faz sentido para o desabrochar do propósito do nosso futuro.
Estar a serviço desse futuro que quer emergir não é trivial. Significa sustentar o lugar do não saber. Entrar em contato com incertezas e inseguranças. Visitar questões que desafiam pressupostos arraigados no nosso modo de pensar e ver o mundo.
Por um lado é incontrolável saber quando eventos de presencing acontecerão espontaneamente em nossas vidas. A boa notícia, por outro, é que há possibilidade de tornarmo-nos mais conscientes sobre eles. Podemos usufruir sua incrível energia generativa e criativa a serviço do nosso propósito e do campo em que atuamos.
Seguidamente vivemos o presencing em processos interativos de grupos desenhados com essa intenção. A natureza é um dos espaços mais poderosos para se ancorar tal experiência e ainda pouco explorada no Brasil. (Acesse: Por que Natureza?)
*Presencing (presenciar), para Otto Scharmer, pesquisador e cunhador deste termo em seu livro Theory U, ocorre quando nossa percepção se conecta com a fonte do nosso futuro emergente. E para o economista Brian Arthur, isso diz sobre se conectar com a fonte do conhecimento interior. Esse ponto de virada é revelado quando as fronteiras entre três tipos de presença desabam: a presença do passado (campo atual), a presença do futuro (o campo emergente do futuro), e a presença do autêntico eu (self). Quando essa fusão começa a ressoar, nós experimentamos uma profunda mudança, a alteração do lugar de onde operamos, diz Scharmer. Metaforicamente falando, Presencing é a capacidade que nos permite operar dessa vasta noção de fonte, de funcionar como um divisor de águas ao sentir o que quer vir a ser, em seguida, permitindo que esse ser se concretize. Presencing é um processo que conecta dois selfs: o existente agora e o nosso autêntico self que quer emergir. Scharmer, indica, ainda, que Presencing é a tecnologia da liberdade. Quando entramos nesse campo, atuamos de um lugar de profunda liberdade e criatividade. Operacionalmente, isso significa que a característica definidora de entrada nesse campo é de se abster de manipulação e de práticas manipulativas. Isso é o coração. Fazendo esse trabalho, tudo que podemos fazer é abrir portas [convidar]. Mas nunca podemos fazer a escolha pelo ser humano de entrar pela porta ou parar em sua frente. Cruzando esse limiar, essa porta, acessamos nosso real poder – o poder de operarmos desse grandioso lugar do nosso futuro self: o poder de conectar com os seres que nos envolvem/rodeiam. Isso tem sido descrito por diferentes tradições como: presença da fonte – Daoismo; estado natural – budismo; Brahman – tradições hindu; Yahweh – judaísmo; Allah – tradições muçulmanas; Deus, Espírito Santo – Cristianismo; Grande Espírito – tradições nativas norte americanas. Theory U. Leading from the future as it emerges. The social Technology of Presencing. Trechos do livro em tradução livre por Marina Minari.